Toda vez que viajo, mesmo à praia, não deixo de visitar o cemitério da cidade em que me hospedo. Ali se encontra toda a história das pessoas comuns: Seus sobrenomes (etnografia), sua relação com a morte, o poder aquisitivo, a longevidade.
Minha cidade é famosa na região pelo museu gratuito a céu aberto existente no cemitério, com cerca de 300 estátuas de Furlanetto.
Minha cidade é famosa na região pelo museu gratuito a céu aberto existente no cemitério, com cerca de 300 estátuas de Furlanetto.
No início do século XX, o escultor nato neste Município, filho de um italiano que aqui montou uma marmoraria, foi enviado à Itália por oito anos para estudar belas artes, pois as esculturas tumulares importadas não geravam grandes lucros à marmoraria.
Lá apelidado de "Menino Americano" conquistou medalha de prata entre os colegas. Seu irmão Jácomo não se destacou.
Formado, Fernando voltou (conforme combinado) para trabalhar na marmoraria do pai. A arte tumular era moda na época, e a morte companheira constante nas famílias numerosas.
Suas maravilhosas esculturas, famosas pelos dedinhos tão perfeitos, se espalharam por igreja e cemitérios em toda a região.
Gostava mesmo de se dedicar à arte pura, sem a conotação fúnebre e a troca comercial, porém não podia se dar a esse luxo. Ainda há nas casas tradicionais do centro, algumas estatuetas suas, de exuberância total.
Morreu em 1975, aos 78 anos, deixando descendentes que ainda vivem no Município.
A imagem acima é Alfredinho Pirajá, esculpido em 1923 com apoio de uma foto, em mármore vindo de Carrara (hoje, nossa região de origem vulcânica exporta mármore e granito de qualidade para lá) .
Esse menininho, filho de um médico, morreu ao ingerir leite em pó estragado. O filho de Fernando, Antônio, serviu de modelo para pés e mãos. O detalhe da roupinha é impressionante!
Esse menininho, filho de um médico, morreu ao ingerir leite em pó estragado. O filho de Fernando, Antônio, serviu de modelo para pés e mãos. O detalhe da roupinha é impressionante!
“Para mim, o mármore é um fascínio; não sei fazer outra coisa. A escultura tem sido a minha vida, e agora que os olhos já não ajudam, sinto apenas tristeza...”. Disse em entrevista, pouco antes de falecer.
Após sua morte, encontrou-se um caderninho com inúmeros devedores da região, que no calor das emoções encomendavam as obras, pagavam umas parcelas, e por fim se "esqueciam". Furlanetto não morreu rico, nem tem um túmulo suntuoso no "seu" cemitério.